CRIAR, ENLOUQUECER E COPIAR
CRIAR,
ENLOUQUECER E COPIAR
O dilema
do escritor diante da página branca
Legar devagar e ler e
divagar. Para isso existem os livros e
os jornais. Para mim, não há satisfação
em apenas ler o texto à minha frente: necessito sublinhar o que considero importante,
genial ou absurdo. Comento, multiplico
uma série de setinhas, sugiro analogias, elogio, critico. Crio um verdadeiro diálogo com o livro.
Aliás, sempre achei que as editoras deveriam criar um meio do leitor conversar
com o autor: elogios, críticas ou comentar seus sentimentos tão parecidos, às
vezes, com aqueles que ele acabou de ler.
À minha frente, um recorte de o
Globo (29/02/2012) com a crônica de Zuenir Ventura: “O escritor e a loucura”.
Neste texto, ele fala sobre a visita de Ruben Fonseca ao norte de Portugal,
mais exatamente a Póvoa de Varzim. O
escritor, normalmente avesso a entrevistas e discursos, pegou o microfone e
disse: “Aqui nesta mesa todos somos loucos” e “A literatura é uma forma
socialmente aceita de loucura”. Segundo ele, a loucura é um elemento
indispensável à escrita. Como a motivação e a imaginação. E ser paciente.
E aí, volto ao meu “ler devagar e
ler e divagar”. Penso nos livros que estão à minha frente e temo não ter tempo
para ler todos eles. Mas não deixo de
comprar mais um, mais outro, todos que aticem a minha curiosidade e provoquem
meu prazer.
Criar um texto, seja uma crônica,
conto, romance, ensaio ou tese, é uma decorrência de um impulso imperativo do
autor: a história aparece, de repente, um título pula à sua frente e então
começam a pulular personagens os mais diversos e travessos, nuances de trama,
diálogos saborosos. E o escritor tem que
buscar rápido seu papel e colocar todo esse mundo que entorna, que pede para ser escrito, exibido, manipulado.
O escritor deve deixar sua
loucura e sua irreverência se manifestarem, transbordar sua fantasia, ir de
encontro ou contra a censura social, sexual, pessoal. O mundo agora pertence aos personagens, ao
tema que escolheu. É a loucura indomada.
Por isso, fixo perplexa diante de
tantas refilmagens, tantos textos repetindo temas já cansados, tanta falta de
imaginação e de ousadia. Por isso, concordo em gênero e número com Lacan,
quando ele diz que a burrice é uma perversão e que a psicanálise pode muito,
mas ela é impotente contra a estupidez.
Certo, certíssimo! Para estes, criar é impossível. Então só lhes resta olhar perplexos a folha
branca. Ou copiar.
Lucia Chataignier – 23/02/2012
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