A Loja de Pianos da Rive Gauche – de T.E. Cahart (Edições
Best Bolso)
Paris é uma metáfora do sonho. Suas ruas, arquitetura, detalhes e cultura,
ultrapassam o desejo, e se encaixa perfeitamente no - com a licença de Freud –
para além do princípio do prazer. As
delícias estão nos detalhes, e, descobrir cada um deles, é um requinte que só
os que apreciam o belo podem curtir. Não
é necessário ver “Paris à meia-noite” para descobrir a cidade: basta caminhar
pelas suas ruas, pelos atalhos e você entenderá o segredo dessa magia
Foi exatamente isso que o autor desse livro delicioso fez:
andando pelas cercanias de sua residência, na Rive Gauche, encontrou uma
lojinha de pianos. Não uma lojinha
qualquer, mas um lugar de consertos (e concertos, por que não?), de peças de
colecionador, de raridades, arte e boa conversa.
Como bem diz o autor, a fachada da loja de pianos tem “um
charme sonolento do século XIX” (pg.11).
Fala de um tempo onde não há pressa, onde cada detalhe dos pianos é
cuidado com a delicadeza de fadas, onde há o registro dos que dedilharam as
teclas dos antigos Pleyel e outros pianos maravilhosos. Há a descrição detalhada do interior do
instrumento, mas não uma descrição fotográfica.
Trata-se de uma observação sobre a alma que está no interior de cada
peça.
Ao ler o livro, percebermos que cada piano trás, na sua
história, elementos tão ou mais humanos, quanto a descrição de pessoas: os tristes, por exemplo, condenados a ficarem
calados, quer pelo mau trato de seus possuidores, quer pelo desinteresse ou falta de talento de seu dono,
são lamentados. Um piano cujo destino é permanecer silencioso, “é como se
confinassem numa solitária alguém que tem muito a dizer” (pg. 33)
O personagem Luc, cuidador de pianos é uma criatura que lida
com a sensibilidade de cada uma de suas peças, de uma maneira delicada, sutil e
entusiasmada . Tanto que, naquela loja,
somente algumas pessoas eram permitidas de entrar. Não há aquela ânsia capitalista de vender,
lucrar e acumular. Para adquirir um
piano, você tem que ser especial.
Cada uma das pessoas que frequenta a pequena loja da
rive-gauche, trás um enriquecimento ao leitor e acrescenta detalhes, os quais
escapam da mera observação de um concerto, pois Cahart descreve a essência de
cada um e de cada passo: “saber tocar as notas, é só o início; o trabalho de
verdade só começa depois, quando quem toca acrescenta algo de si à intenção do
compositor.
Enfim, esse livro é um poema delicioso que ilustra e faz com
que nunca mais olhemos um piano da mesma maneira.
Mas para isso “bata à porta, seja paciente e Paris poderá
oferecer-lhe mais um de seus inestimáveis prazeres” (pg.9).
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